Imagine a seguinte situação, o seu processo produtivo (que podem ser para produzir de vidro, cimento, papel, energia a partir dos gases de uma caldeira ou processos siderúrgicos para produzir aço) emite como resultado da elaboração do produto um fluxo de gás com uma vazão de 900.000 m3/h, a uma temperatura de 250oC, com uma concentração de pó de 20 g/m3. Uma vez que esse valor exigido é algumas ordens de grandeza menor do que o gerado, há que se filtrar o material gerado durante a produção, sendo que um equipamento que pode ser utilizado para a retenção do material particulado é o Precipitador Eletrostático (PE).
Um precipitador eletrostático é um filtro, as suas dimensões são próximas a de um prédio de 5 andares. Internamente há corredores por onde gases passam e ocorre a captura do pó. A Figura 1 é uma imagem ilustrativa de um PE.
Figura 1 – Imagem esquemática de um precipitador eletrostático
O princípio de funcionamento deste equipamento é baseado em eletricidade básica. Uma brincadeira que é feita nas escolas desde sempre, consiste em você passar um pente nos cabelos e, na sequência aproximar, o pente de pedaços de papel picado. O pente que foi eletrizado pelo atrito no cabelo está carregado eletricamente e atrai o papel.
O processo de captação de pó de um PE funciona de maneira semelhante, pois o gás oriundo de processos de fabricação contém material particulado. Essas partículas entram no PE e são eletrizadas por eletrodos que ficam dispostos no meio dos corredores. As paredes desses corredores contem placas com cargas de sinal trocado ao dos eletrodos e, dessa maneira, as partículas agora carregadas negativamente são atraídas para as placas que estão positivas (ou vice-versa).
De maneira ao texto ficar mais didático, a Figura 2 é um desenho esquemático onde podem ser vistos um precipitador, um ventilador e uma chaminé. Do lado esquerdo do PE existe um processo produtivo qualquer que gera um fluxo de ar com partículas, essa fumaça passa pelo PE devido a baixa pressão gerada por um ventilador (que atua como exaustor, mas tecnicamente é chamado de ventilador) e sai pela chaminé, onde normalmente, existem instrumentos de medição da qualidade desse fluxo de ar proveniente do processo.
Figura 2 Desenho esquemático de um processo produtivo que utiliza PE como elemento filtrante de gases
Na Figura 3 são mostrados diversos tipos de eletrodos, chamados de eletrodos de descarga, utilizados para diferentes tipos de pós e colocados em diferentes locais dentro dos corredores de um PE. A parte de cima da imagem mostra o topo de diversos tipos de eletrodos de descarga e a parte de baixo mostra os perfis desses eletrodos.
Figura 3 – Alguns tipos de eletrodos(chamados de Eletrodos de Descarga)
Esses eletrodos de descarga emitem o campo elétrico que pode ser visto na Figura 4. No desenho esquemático em (b) há uma planta de um corredor de um PE. Os pequenos círculos são os eletrodos de descarga, as linhas com setas que saem desses pontos circulares e se encaminham para as laterais (que são as placas coletoras – collection electrode) são as linhas de campo elétrico. As partículas de pó são eletrizadas por esse campo elétrico de maneira semelhante ao pente na experiência da escola. Esse pó, agora eletrizado, é atraído para a placa coletora e sai do fluxo de gás.
Figura 4 – Desenho esquemático da distribuição das linhas de campo elétrico entre um eletrodo de descarga e uma placa coletora no interior do PE
Esse processo captura as partículas presentes nos gases, limpando-o e deixando de acordo com as normas ambientais vigentes.
O pó acaba sendo colado eletricamente à placa coletora, mas, depois de um tempo, as placas coletoras estarão cobertas pelo pó, e isso diminuirá a eficiência do processo, então usa-se um sistema de martelos para bater nessas placas. Com o impacto do martelo na placa, o pó cai e sai pela parte de baixo do PE. As partículas de pó apresentam tanto mais cargas elétricas quanto maiores forem o tamanho delas. Consequentemente, quando eletrizadas, as partículas menores têm menos cargas e são menos atraídas pelas placas coletoras que se encontram nas laterais e inversamente, as partículas maiores, que têm mais carga, e são atraídas com mais facilidade.
Esse comportamento é regido pela equação de Coulomb:
F = qE
Onde F será a força de atração e q a carga e E é o campo elétrico criado pela placa coletora (a partir de um transformador). A carga q depende da massa da partícula, quanto maior a massa maior a quantidade de carga associada.
O resultado é que em um precipitador eletrostático comum são necessários vários campos elétricos diferentes para capturar partículas de diferentes tamanhos, de diferentes granulometrias. Cada campo elétrico é criado por um tipo de transformador especial, chamado transformador retificador TR. Quanto menor o tamanho da partícula, maior a tensão necessária do TR para desenvolver um campo elétrico mais intenso e atrair essa partícula de pó. Na figura 5 é apresentado de forma esquemática, o fluxo de ar proveniente da produção entra pelo lado esquerdo, passa pelo PE, que apresenta 4 campos elétricos diferentes (as tensões crescem de 50 a 100kV), e sai pelo lado direito.
Figura 5– Desenho esquemático da distribuição granulométrica do pó capturado em função das tensões dos transformadores no interior do PE
O precipitador, então, é dividido em uma série de seções ou campos, energizados independentemente. Cada seção possui conjuntos individuais de transformadores-retificadores, com controles de estabilização de tensão e condutores de alta tensão, que energizam os eletrodos de descarga. Isso permite maior flexibilidade para energizar campos individuais, conforme as condições particulares que variam no precipitador.
De um modo geral, a maioria dos fornecedores de PE recomenda que o precipitador tenha pelo menos quatro ou mais campos, podendo ser necessário projetar a unidade com sete ou mais campos, para alcançar uma eficiência de coleta de 99,9%.
A principal propriedade a ser estudada no pó que será coletado pelo PE é a resistividade. A resistividade é mesma propriedade elétrica que estudamos no colégio, que consiste na medida do quanto de dificuldade a corrente elétrica terá para atravessar um determinado material quando ele estiver conectado a uma tensão elétrica. No caso do material particulado presente no fluxo de gás que atravessa o PE a resistividade é uma condição das partículas na corrente de gás que pode alterar a eficiência real de coleta de um PE. Resistividade é um termo que descreve a resistência da camada de poeira coletada ao fluxo de corrente elétrica. Por definição, a resistividade é a resistência elétrica de uma amostra de poeira com 1,0 cm2 de área seccional, 1,0 cm de espessura e com unidades em Ω.cm (ohms × centímetros). Ela também pode ser descrita como a resistência à transferência de carga pela poeira. Para facilidade de interpretação e análise os valores de resistividade da poeira são classificados, de maneira aproximada, em três grupos:
- Entre 10e4 e 10e7 Ω.cm—baixa resistividade
- Entre 10e7 e 10e10 Ω cm—resistividade normal
- Acima de 10e10 Ω.cm—alta resistividade
Cada um desses tipos de resistividade (alta, normal ou baixa) impacta na eficiência do PE e dependem do tipo do material particulado.
Partículas com baixa resistividade são difíceis de coletar, pois são facilmente carregadas, porém perdem sua carga ao tocar na placa coletora. Dessa forma, as partículas podem ricochetear nas placas e voltarem a ser transportadas pelo fluxo de gás, escapando pela chaminé. Exemplos de poeiras de baixa resistividade são o carbono não queimado em cinzas e o negro de fumo.
Partículas com resistividade normal não perdem rapidamente sua carga ao tocarem na placa coletora. Essas partículas liberam lentamente sua carga e ficam retidas nas placas de coleta por forças adesivas e coesivas intermoleculares. Isso permite que uma camada de material particulado seja formada por cima das placas. Nesta faixa de resistividade da poeira (entre 10e7 e 10e10 Ω cm), os pós presentes são coletados de forma mais eficiente.
Partículas que apresentam alta resistividade são difíceis de serem carregadas eletricamente. Uma vez que finalmente estas adquiram carga, elas não a liberam facilmente ao tocar na placa coletora, não saindo facilmente durante o batimento de martelo, a eficiência de coleta do precipitador, que, em casos severos, pode cair para menos de 50%.
Como a resistividade é uma propriedade intrínseca do material e, neste caso, do pó, então utilizam-se técnicas para modificar a resistividade dele, de forma que se converta a um material de resistividade classificada como normal, para ser de fácil coleta.
Assim, a resistividade alta pode ser geralmente reduzida ajustando a temperatura e o teor de umidade da corrente de gás, sendo que a resistividade das partículas diminui tanto para altas quanto para baixas temperaturas.
Na Figura 6, temos o gráfico de temperatura dada em fahrenheit no eixo dos x e resistividade aparente no eixo dos y. As curvas para diversas porcentagens de umidade apresentam um formato quase parabólico, com valores de resistividade normal, como descrito acima, para valores mais altos e mais baixos de temperatura.
Figura 6 – Gráfico de resistividade do pó variando com a temperatura e a porcentagem de umidade
A partir dos valores do gráfico acima pode-se perceber que a adição de água e a variação da temperatura altera a resistividade de alta até média. Aumentar o teor de umidade do fluxo de gás reduz a resistividade. Isso pode ser realizado pulverizando água ou injetando vapor nos dutos de entrada do PE. Tanto no que se refere ao ajuste de temperatura quanto da modificação da umidade, é necessário manter as condições do fluxo de gás acima do ponto de orvalho para evitar problemas de corrosão nas partes internas do PE.
Modelagem Matemática
A partir de papers e livros é possível desenvolver um modelo matemático visando obter o tamanho das placas coletoras e estimar as características básicas de um precipitador e assim projetar um precipitador eletrostático. Utilizando como dados de entrada a temperatura do fluxo de gás, valor do fluxo, composição química do material particulado, distribuição granulométrica do pó é possível obter a área das placas coletoras e, assim, o dimensionamento do precipitador eletrostático. A Figura 7 é uma imagem de uma parte deste modelamento que desenvolvi a partir de textos propostos pela EPA (Environmental Protection Agency) e que alterei com algumas equações dos livros apresentados na pequena bibliografia mostrada no final deste texto.
Figura 7 – Imagem de uma parte da Modelagem Matemática para definição da área das placas de um PE
Para saber mais e entender de onde foram tiradas as imagens do texto sugiro a seguinte bibliografia:
Air Pollution Control a Design Approach 4ª ed C. David Cooper e F.C. Alley
AIR POLLUTION CONTROL EQUIPMENT SELECTION GUIDE-Lewis Publishers (2002) Kenneth C. Schifftner –
Air pollution control equipment calculations-John Wiley & Sons (2008) Louis Theodore –
James H. Turner, Phil A. Lawless, Toshiaki Yamamoto, David W. Coy, Gary P. Greiner, John D. McKenna & William M. Vatavuk (1988) Sizing and Costing of Electrostatic Precipitators, JAPCA, 38:4, 458-471
Air Pollution Control Equipment-Springer-Verlag Berlin Heidelberg (1981) Professor Dr.-Ing. Heinz Brauer, Professor Dr. Yalamanchili B. G. Varma (auth.) -
(1975) Information Required for the Selection and Application of Electrostatic Precipitators for the Collection of Dry Particulate Material, Journal of the Air Pollution Control Association, 25:4, 362-368
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